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  1. O som da montanha, de Kawabata

    sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

    Título: O som da montanha
    Título original: Yama no oto
    Autor: Yasunari Kawabata
    Tradutora: Meiko Shimon
    Editora: Estação Liberdade
    Número de páginas: 344
    Publicação no Brasil: 2009


    O livro veio com um bonito marcador do próprio livro:


     ***
    Quando o som parou, ele se sentiu aterrorizado. Teve calafrios ao imaginar que talvez fosse o prenúncio de sua morte.

    Shingo Ogata é quem ouve o som da montanha. Ele é o patriarca sexagenário de uma família que passa por momentos de turbulência: o filho, Shuichi, arranja uma amante e despreza a esposa, Kikuko, que também mora com os sogros; enquanto a filha, Fusako, está se separando de um marido viciado em drogas e provavelmente traficante, que acaba indo morar com as filhas pequenas na casa dos pais.

    Enquanto pressente a morte chegando, Shingo reflete sobre algumas frustrações ao longo da vida: era apaixonado pela bela irmã mais velha da esposa, que havia se casado com outro homem e morreu muito jovem; acabou casando-se com Yasuko, que não era muito graciosa, mas tinha a expectativa de gerar uma filha tão bela quanto a cunhada, o que não aconteceu - Fusako, aos olhos de Shingo, não era bela e não tinha modos, mas ainda tinha a expectativa de que uma de suas netas desenvolvesse algum tipo de beleza; pensa que talvez não tenha criado bem os filhos, principalmente Shuichi, que parece ter um sério desvio de caráter - apesar de pai e filho trabalharem na mesma empresa, em Tóquio, o filho não volta para casa com o pai, pois vai dançar em bailes com a secretária do pai ou encontrar a amante.

    Devido à idade, Shingo se esquece com facilidade de fatos corriqueiros, mas recorre principalmente à esposa, à Kikuko e à secretária, que o ajudam a lembrar. No último capítulo, compartilhamos um pouco da angústia do patriarca: em uma manhã, enquanto se preparava para trabalhar, não se lembra mais de como fazer o nó da gravata, embora tenha feito isso ao longo de quarenta anos, Kikuko tenta ajudá-lo, mas não consegue e acaba chamando a sogra.

    Publicado em 1954, O som da montanha traz características dos anos do Japão pós-guerra, quando o país passa por um período de "ocidentalização": Shingo usa terno para trabalhar, mas kimono em casa; as mulheres estão, aparentemente, se tornando mais independentes (várias vestem roupas ocidentais e trabalham fora, como a secretária de Shingo); no capítulo "O jardim da capital", Kikuko aparece ouvindo Les sylphides, de Chopin; a separação de casais não parece ser um tabu; o uso de aparelhos  como aspirador de pó e barbeador elétrico.

    Yasunari Kawabata

    No mesmo ano de publicação do livro, o diretor Mikio Naruse adaptou-o para o cinema. Vi o filme, lançado recentemente em uma coleção da Folha, "Grandes livros no cinema", mas achei o ritmo um pouco monótono. Para quem não leu o livro, ver o filme talvez seja entediante. O final é diferente do livro, mas igualmente plausível.

    Kikuko e Suichi na capa

    Uma das características da trama que fica muito mais sutil no filme é a ambiguidade da relação entre Shingo e a nora. No livro há uma tensão que permeia toda a narrativa, pois Shingo a vê tanto como uma jovem filha que precisa de ajuda e proteção (que o marido não lhe proporciona) quanto uma mulher bela e amorosa que lhe provoca desejos sensuais (seu cheiro e a maneira como se movimenta, por exemplo). Essa atitude provoca um certo ciúmes em Fusako, filha de Shingo, que uma vez diz explicitamente que o pai trata melhor a nora que ela própria.

     Kikuko e o sogro observam um girassol na casa de vizinhos

     Kikuko com os sogros, Yasuko e Shingo

    Kikuko também apresenta certa ambiguidade, demonstrando um imenso carinho pelo sogro. No capítulo "O jardim da capital", Kikuko convida Shingo para um passeio e uma conversa no parque Shinjuku Gyoen. Ela estava passando alguns dias na casa dos pais, para restabelecer a saúde, mas queria voltar para a casa dos sogros em Kamakura, nas cercanias de Tóquio, e estava sem jeito.


    Shinjuku Gyoen (foto tirada daqui)

    Shingo e Kikuko entraram no gramado e andaram entre os casais em encontro amoroso, mas ninguém deu atenção a eles. Shingo procurou passar longe desses casais.
    No entanto, o que Kikuko estaria pensando? Não eram nada mais do que um velho sogro e a jovem nora que vieram ao parque, mas Shingo não conseguira se adaptar à situação.
    Não dera importância ao telefonema de Kikuko, que marcou o encontro no Shinjuku Gyoen, mas agora que estava ali achava algo estranho.
    ...

    - Se você tem algo a me contar, antes de voltar para casa...
    - Para o senhor? Tenho tanta coisa que gostaria de lhe dizer, mas...


    Ao mesmo tempo que faz um balanço de sua vida e percebe que está, aos poucos, se desligando da vida e se afastando de momentos presentes, Shingo observa a beleza da natureza, que permanecerá inalterada, mesmo quando ele já tiver partido.

    ***

    Somen (macarrão gelado)

    No livro alguns pratos são citados, mas não o somen. Apesar disso, escolhi fazer essa receita, pois temos os dias de verão têm sido extremamente quentes e esse prato gelado combina perfeitamente com o clima. Incrementei a receita com ovos - na receita "tradicional", eles não são usados.



    Ingredientes:

    1 pacote de macarrão para somen (400 g)
    1/2 pacote de kamaboko (massa processada de peixe)
    1/2 pacote de tikuá (massa processada de peixe em formato circular com um furo no centro)
    2 pacotes pequenos de katsuo (peixe seco ralado)
    1 envelope de hondashi
    2 ovos fritos com um pouco de sal, açúcar e Aji-no-moto e cortados em tiras bem finas
    6 colheres (sopa) de shoyu 
    1 pitada de Aji-no-moto
    3 colheres (sopa) de saquê
    250 ml de água para o molho
    cebolinha a gosto
    gengibre ralado a gosto
    Folhas de nori (algas marinha) cortadas em tiras pequenas


    Na embalagem está escrito "Somen" em hiragana :)

    Katsuo (peixe seco ralado)



    Modo de preparo:

    Cozinhar o macarrão por cerca de 3 minutos (como os fios do macarrão são finos, ele cozinha bem rápido), escorrer em água fria e, para mantê-lo gelado, pode-se misturar algumas pedras de gelo a ele.




    Para o molho, misturar a água, o shoyu, o saquê, o katsuo, o hondashi e o Aji-no-moto e deixar ferver. [Também acrescentei um pouco de açúcar nesse molho, para suavizar o gosto do shoyu.] Depois, colocar o molho na geladeira.


    Enquanto isso, preparar e cortar os demais ingredientes.


    Depois, é só colocar o macarrão, o molho e os demais ingredientes em uma tigela (a tigela japonesa apropriada se chama tchawan).



    いただきます.
    Itadakimasu!

  2. 1 comentários:

    1. A receita no final parece uma delícia! E que história... Deixei minha resenha lá no Skoob.

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